Meritocracia: Será que o sucesso depende apenas do esforço individual?

Uma reflexão sobre a meritocracia, suas falácias e o impacto das desigualdades estruturais.

SOCIEDADE E COMPORTAMENTOREFLEXÕES SOBRE A VIDAPSICOLOGIA E COMPORTAMENTO

Psicóloga Janaína Gomes

1/25/20252 min read

O mito da meritocracia.
O mito da meritocracia.

"Se você se esforçar o suficiente, vai chegar lá." Essa frase, repetida como um mantra motivacional, é a espinha dorsal da meritocracia: a ideia de que todos têm as mesmas chances de vencer, desde que trabalhem duro.

Mas será que isso é verdade? Ou será que a meritocracia é apenas um mito confortável que nos impede de olhar para as desigualdades estruturais?

Imagine uma corrida onde todos largam do mesmo ponto, mas alguns têm sapatos de corrida de última geração, enquanto outros estão descalços. Agora imagine que alguns nem sequer estão na pista, mas presos atrás de muros altos que precisam escalar antes de começar a correr.

Essa é a realidade da meritocracia no mundo real. Não é uma corrida justa. É uma competição onde o ponto de partida de cada pessoa é determinado por fatores que estão fora de seu controle: a família em que nasceu, a educação que teve acesso, sua cor de pele, gênero, ou até mesmo o bairro onde cresceu.

Dizer que o sucesso depende apenas do esforço é ignorar essas desigualdades estruturais.

Quem defende a meritocracia muitas vezes não enxerga os privilégios que possui. Afinal, privilégios são como o ar: quem os tem não percebe, mas quem não os tem sente a falta.

Privilégio não significa que sua vida foi fácil; significa apenas que certos obstáculos não estavam no seu caminho. Se você teve acesso a uma boa escola, uma rede de contatos ou até mesmo a tranquilidade de crescer em um ambiente seguro, já começou a corrida com vantagem.

A meritocracia parte do princípio de que todos têm a mesma capacidade de esforço. Mas será que isso é verdade?

Pense em alguém que trabalha dois empregos para sustentar a família e ainda tenta estudar à noite. O esforço dessa pessoa é imenso, mas ela compete no mercado com alguém que teve tempo e recursos para fazer um intercâmbio ou uma pós-graduação. O esforço dela vale menos?

O lado mais cruel da meritocracia é que ela transforma o fracasso em culpa individual. Se você não “chegou lá”, é porque não tentou o suficiente, certo? Errado.

Essa narrativa ignora que o sistema é feito para que nem todos vençam. O mercado de trabalho, por exemplo, não tem vagas para todos os formados. A competição é desenhada para excluir. Mas, em vez de questionarmos o sistema, culpamos os indivíduos.

Desconstruir a ideia de meritocracia não significa defender o fim do esforço ou da ambição. Pelo contrário, significa reconhecer que o mérito só faz sentido em um campo minimamente equilibrado.

Isso passa por políticas públicas que garantam igualdade de oportunidades, como educação de qualidade, saúde acessível e combate ao racismo e à discriminação de gênero. Passa por admitir que, sem redistribuição de privilégios, a meritocracia continuará sendo uma farsa conveniente para quem já está no topo.

A meritocracia é uma ideia sedutora porque nos dá a ilusão de controle: se eu trabalhar duro, vou vencer. Mas a realidade é muito mais complexa e, muitas vezes, injusta.

Reconhecer isso não é desistir de lutar, mas entender que, enquanto continuarmos ignorando as desigualdades, o mérito será menos sobre esforço e mais sobre sorte no ponto de partida.

E aí, até quando vamos insistir nesse conto de fadas?

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